Mesa Redonda: Diários Gráficos e Conhecimento Científico
Março 2009
Nas publicações em Ciências Naturais, a comunicação é um dos factores mais importantes na divulgação das investigações e resultados das mesmas. Recorre-se muitas vezes à ilustração científica, para facilitar a descrição de animais, plantas ou, em alguns casos, técnicas utilizadas. Através de uma correcta utilização da técnica, o ilustrador capta as características do ser vivo, traduzindo-as num trabalho pictórico, capaz de transmitir o conhecimento necessário.
A utilização da imagem nas ciências, sob a forma de ilustrações científicas, tem a sua origem há cinco séculos atrás com nomes como Leonardo da Vinci, Durer, entre outros. Desde então muitos são os exemplos de cientistas cujas descobertas estão descritas sob a forma de desenho. Mas a utilização do desenho e da imagem por parte dos cientistas não se restringe à ilustração científica. Cientistas e naturalistas, desde sempre se fizeram acompanhar, na suas saídas de campo, de pequenos cadernos nos quais registam, sob a forma de desenho, as observações efectuadas.
Cada vez mais se observa o recurso a estes cadernos de registo conhecidos entre os cientistas como os Cadernos de Campo (Diários gráficos entre os artistas). Hoje em dia, muitos realizam viagens organizadas, com períodos longos de observação, com o único intuito de desenharem. Durante várias horas observam atentamente as espécies escolhidas, e registam no papel tudo o que é observado.
Mas afinal para que servem os cadernos de Campo? São diferentes dos diários gráficos dos artistas?
Serão apenas uma forma de registo diário, meticuloso, das observações realizadas num determinado dia, a captação de um momento que não querem deixar passar, um acto inconsequente, através do qual ficam registados o dia a dia, as relações com o próprio e com os outros e com o meio ambiente que os rodeia?
Terão estes desenhos um significado diferente para os cientistas? Poderá o desenho ser uma ferramenta de investigação que, quando utilizada de forma correcta auxiliará num processo cognitivo de compreensão de fenómenos científicos? Os riscos de um cientista inscreve no papel podem ter um papel interpretativo da realidade diferente do artista?. Da Vinci tentou compreender o voo das aves através do desenho. Isso faz dele um cientista ou um artista?
Esta questão parece não preocupar, de todo, os cientistas que recorrem às técnicas artísticas para realizar os seus desenhos nos Cadernos de Campo. Ambos, cientistas e artistas tiram partido do gozo que lhes dá ter um papel branco e nele registar tudo o que observam.
O mais importante não é o resultado final, o desenho, mas sim o que está a ser observado e registado, o momento em que o fazem.
O acto de desenhar deixa de ter importância pelo resultado mas sim pela aprendizagem do que nos rodeia. Tal como Paul Valéry defende “existe uma diferença imensa entre ver uma coisa sem um lápis na mão e vê-la desenhando.... percebemos o que ignorávamos, que nunca antes o tínhamos visto verdadeiramente. Até aí, os olhos só tinham servido de intermediários.”... mas isto só podemos perceber depois de desenharmos. (Ana Teresa Bígio)
CVs
Pedro Salgado
Pedro Salgado (Lisboa, 1960) é biólogo (Univ. Lisboa, 1984) e ilustrador científico (Univ. California, Santa Cruz, 1989). As suas ilustrações de peixes foram premiadas em diversas ocasiões nos congressos da Guild of Natural Science Illustrators, no World Congress of Biomedical Communications,Florida, USA, e pela National Geographic Magazine, USA.
Foi autor (ilustrações e textos) dos calendários oficiais da EXPO'98, e desde 1995, tem vindo a ilustrar os organismos do Oceanário de Lisboa. Realizou 14 séries de selos ( botânica e zoologia) para os CTT Portugal e Correios de Angola e Guiné (incluida a série Peixes portugueses, 2006). Desde 1989, desenvolveu mais de uma centena de acções de formação em ilustração científica, através de cursos, workshops e conferências, em Universidades, Museus e outras instituições de Portugal, Espanha, Moçambique e EUA. É professor convidado no Mestrado em Desenho da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, no Mestrado em Ilustração na Escola Superior de Artes do Porto – Guimarães, e responsável pelo Curso de Ilustração Científica do IAO - Universidade Autónoma de Lisboa. Trabalha como freelancer no seu atelier.
Guida Casella
Guida Casella é Licenciada em Belas Artes pela FBAUL e tem um Mestrado em Ilustração Arqueológica pela University of Bath, Reino Unido, cuja tese contemplou a História do Desenho Arqueológico em Inglaterra e Portugal, analisando a produção de imagens de cariz histórico e arqueológico do séc.XIX sob a categoria Estética do Pituresco. (The Picturesque in Archaeological / Historical Landscape Illustrations, Univ. Bath, 2005). Após a Licenciatura em Pintura especializou-se em Ilustração Cientifica, frequentando vários workshops de Ilustração Cientifica, e atravéz de um estágio profissional no Departamento de Arqueologia e Antropologia no Royal Ontario Museum, Toronto, Candá. Iniciou a carreira de Ilustradora de Arqueologia desenhando o polémico achado que foi sepultura do Menino do Lapedo (Abrigo do Lagar Velhor, Leiria, possivel prova de cruzamento de hommo sapiens com hommo neanderthal), publicado nacional e internacionalmente. Profissionalmente tem colaborado com diferentes Instituições como o Instituto Arqueológico Alemão, o Instituto Português de Arqueologia, o Instituto Português do Património Arquitectónico, o Centro de Arqueologia Náutica e Subaquática, entre outros. Realizando Ilustração Cientifica de Achados Arqueológicos, Levantamentos em Escavação, Paineis Museográficos e Infografia. Tem proferido palestras em congressos e leccionado cursos de Ilustração Arqueológica, Reconstrução Histórica, Divulgação de Património para Museologia em várias instituições como a Faculdade de Belas Artes de Lisboa, Ar.Co, Instituto de Artes e Oficios da Universidade Autónoma, Instituto Geológico e Mineiro INETI, Escola Profissional de Arqueologia de Mértola. Recentemente interessa-se sobre a produção de imagens para Marketing em Museus e Divulgação em Turismo Cultural e Serviços Educativos. A sua missão é tornar acessível o património Histórico e Arqueológico a um público mais vasto.
Pedro Fernandes
Licenciou-se em 2003 em Geologia, pela Faculdade de Ciencias da Universidade de Lisboa. Em 2006 ganhou uma bolsa de estudos da Fundacao Gulbenkian/FLAD, rumando aos Estados Unidos, onde concluiu uma pós-graduação em Ilustração Científica na University of California, Santa Cruz Extension. Especializou-se em Ilustração Ornitologica, tendo sido aluno de pos-graduação no Cornell Lab of Ornitology em 2007/2008, para o qual produziu diversas ilustrações. Actualmente reside em Lisboa e trabalha em ilustração.
Olga Pombo
Olga Pombo é licenciada em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (1971), concluiu em 1986 o mestrado em Filosofia Moderna pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, apresentando uma dissertação intitulada Leibniz e o Problema de uma Língua Universal. Em 1998 doutorou-se em História e Filosofia da Educação pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa com através da dissertação Unidade da Ciência e Configuração Disciplinar dos Saberes. Foi coordenadora científica dos projectos Enciclopédia e Hipertexto (FCT- Sapiens, 1999-2002), Cultura Científica. Migrações Conceptuais e Contaminações Sociais (FCT - Sapiens, 2002-2005). É actualmente professora Auxiliar da Secção Autónoma da História e Filosofia da Ciência da FCUL, Associated Researcher do Projecto Internacional La Science dans ses Contextes- Pragmatisme Dialogique, membro de diversos projectos internacionais e nacionais e coordenadora do projecto FCT A Imagem na Ciência e na Arte. É coordenadora científica do Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa(CFCUL) desde 2002 e coordenadora da Secção Autónoma de História e Filosofia das Ciências da FCUL desde 2007.
Ana Teresa Bígio
É licenciada em Biologia Aplicada aos recurso Animais marinhos pela FCUL (2004). Desde sempre se dedicou à Ilustração Científica tendo em 2006 realizado uma pós graduação em Design e Cultura Visual (Ilustração Cientifica) no IADE. Concluiu o Mestrado em Design e Cultura Visual, na vertente de ilustração científica, no IADE, com uma tese intitulada "Ilustração científica - a utilização da imagem nas Ciências Biológicas"(2007). Fez formação em Ilustração Científica desde 1998 com o Professor Pedro Salgado e frequentou o curso de Ilustração Biológica no Shoals Marine Laboratory na Universidade de Cornell, leccionado pelo Professor Bill Orber. Tem participado em diversas conferencias, relacionadas com a utilização da imagem nas Ciencias, a mais recente do CNRS - Cognitive Foundations of Scientific Images. Actualmente é professora na Escola Superior de Design no IADE, é membro integrado do CFUL e do projecto “A Imagem na Ciência e na Arte”, e Ilustradora Científica freelancer.