Paulo Mendes
Fevereiro 2011
Engenhos para uma
revolução precária
Um comentário à obra de Susana Gaudêncio
Uma fábrica.
Uma folha branca numa sala branca numa fábrica modernista que fabricava armas.
Negro, negro da grafite, linhas consecutivamente paralelas que produzem construções, construções intemporais, a construção das revoluções e das utopias, espaços de utopia.
Lumière devolveu-nos o real, Méliès deslumbrou-nos com a fantasia – a fantasia que ingenuamente acompanha as revoluções reais.
Edifícios ilusórios, lugares da construção abstracta do poder – económico político – as figuras da representação. A arquitectura como arena onde se sucedem os conflitos...
Os trabalhos artísticos são diagnósticos da nossa contemporaneidade. Os artistas colocam questões mas não lhes cabe dar respostas. Por vezes podemos fazer as perguntas de forma a provocar uma determinada resposta, mantendo livres os canais de circulação da discussão.
Muitas vezes os artistas contemporâneos apropriam-se de formas e formatos pré-estabelecidos para descodificar modelos e produzir outras correntes de realidade e narrativas alternativas.
A criação artística está historicamente ligada ao desejo de mudança e à alteração de paradigmas estéticos e sociais. Uma evolução contínua espelhada pelas vanguardas artísticas do modernismo. Falhado esse processo resta-nos a interferência em pequena escala, a experiência colectiva e de participação. Da utopia universal para o trabalho local.
(…)
Uma insurreição, já nem sequer somos capazes de ver onde é que isso começa. Sessenta anos de pacificação, de suspensão dos tumultos históricos, sessenta anos de uma anestesia democrática e de gestão dos acontecimentos enfraqueceram em nós uma certa percepção abrupta do real
A impressão de viver numa mentira ainda é uma verdade.
Quando falamos de Império, nomeamos os dispositivos de poder que, preventivamente, cirurgicamente, retêm todos os devires revolucionários de uma situação. Assim, o Império não é um inimigo que nos confronta. É um ritmo que se impõe, uma forma de actualizar a realidade até ao seu esgotamento.
Mais do que uma ordem do mundo trata-se do seu esgotamento triste, pesado e militar.
Dois séculos de capitalismo e de niilismo mercantil culminaram na mais extrema estranheza, em relação a si mesmo, aos outros, aos mundos. O indivíduo, esta ficção, decompõe-se à mesma velocidade que se torna real.
Excerto do texto apresentado por Paulo Mendes / 2011
ENGENHOS PARA UMA REVOLUÇÃO PRECÁRIA foi o título da apresentação performativa que Paulo Mendes realizou através da leitura de um texto acompanhada simultaneamente pela projecção de um vídeo.
CV
Um comentário à obra de Susana Gaudêncio
Uma fábrica.
Uma folha branca numa sala branca numa fábrica modernista que fabricava armas.
Negro, negro da grafite, linhas consecutivamente paralelas que produzem construções, construções intemporais, a construção das revoluções e das utopias, espaços de utopia.
Lumière devolveu-nos o real, Méliès deslumbrou-nos com a fantasia – a fantasia que ingenuamente acompanha as revoluções reais.
Edifícios ilusórios, lugares da construção abstracta do poder – económico político – as figuras da representação. A arquitectura como arena onde se sucedem os conflitos...
Os trabalhos artísticos são diagnósticos da nossa contemporaneidade. Os artistas colocam questões mas não lhes cabe dar respostas. Por vezes podemos fazer as perguntas de forma a provocar uma determinada resposta, mantendo livres os canais de circulação da discussão.
Muitas vezes os artistas contemporâneos apropriam-se de formas e formatos pré-estabelecidos para descodificar modelos e produzir outras correntes de realidade e narrativas alternativas.
A criação artística está historicamente ligada ao desejo de mudança e à alteração de paradigmas estéticos e sociais. Uma evolução contínua espelhada pelas vanguardas artísticas do modernismo. Falhado esse processo resta-nos a interferência em pequena escala, a experiência colectiva e de participação. Da utopia universal para o trabalho local.
(…)
Uma insurreição, já nem sequer somos capazes de ver onde é que isso começa. Sessenta anos de pacificação, de suspensão dos tumultos históricos, sessenta anos de uma anestesia democrática e de gestão dos acontecimentos enfraqueceram em nós uma certa percepção abrupta do real
A impressão de viver numa mentira ainda é uma verdade.
Quando falamos de Império, nomeamos os dispositivos de poder que, preventivamente, cirurgicamente, retêm todos os devires revolucionários de uma situação. Assim, o Império não é um inimigo que nos confronta. É um ritmo que se impõe, uma forma de actualizar a realidade até ao seu esgotamento.
Mais do que uma ordem do mundo trata-se do seu esgotamento triste, pesado e militar.
Dois séculos de capitalismo e de niilismo mercantil culminaram na mais extrema estranheza, em relação a si mesmo, aos outros, aos mundos. O indivíduo, esta ficção, decompõe-se à mesma velocidade que se torna real.
Excerto do texto apresentado por Paulo Mendes / 2011
ENGENHOS PARA UMA REVOLUÇÃO PRECÁRIA foi o título da apresentação performativa que Paulo Mendes realizou através da leitura de um texto acompanhada simultaneamente pela projecção de um vídeo.
CV